Voice of Thunder (aka PagadoMjolnir +1)
Magical Warhammer (Requires Attunement) - Uncommon - 18.800 POs
Usando este martelo, que é uma cópia de uma arma lendária, você recebe +1 de ataque e dano em suas jogadas de ataque e 3/rodada você pode adicionar 1d8 Elétrico ao dano de um ataque bem-sucedido.
Hexwarrior´s Magic
Pré-Requisito: Pact of the Blade, 12º nível
Quando o warlock conjurar uma magia de 1º nível ou maior que use uma Ação, ele poderá usar sua Ação Bônus pra realizar um ataque com sua Arma do Pacto em um inimigo no seu alcance.
Provavelmente seguirei um esquema de classe combatente focada em armas de fogo.
-Armas de Fogo: Provavelmente seriam armas com dano normal que teriam bônus de dano conforme a classe/subclasses evoluem, algo semelhante ao que acontece com o Paladino (que no 11º nível adiciona 1d8 a todos os ataques com armas). A ideia seria diferenciar do guerreiro, tendo menos ataques mas mais dano por ataque.
- Subclasse: Atirador de Elite - essa subclasse seria focada em dano e crítico. Um guerreiro/barbaro a distância, basicamente.
- Subclasse: Especialista - essa subclasse usaria armas diferentes, focando em habilidades de área, como explosivos, metralhadoras, lança-chamas, etc
- Subclasse: Líder de Esquadrão - essa subclasse seria um cara voltado a buffar os aliados, permitindo que eles tivessem vantagem em ataques, ataques extras, uma subclasse que seria um meio-bardo de combate.
*Destruidor - Subclasse de Bárbaro focada em crítico*
- Nível 3: Habilidade Ativa - Trespassar Instantâneo (algo como uma Ação para atacar X alvos melee)
- Nível 6: Utility Passiva - Habilidades que podem ser usados quando o personagem tiver um Ataque Crítico. Possibilidades: derrubar/empurrar automático, poder recuperar PVs gastando Hitdie, etc.
- Nível 10: Habilidade Ativa - Dobrar dano contra objetos. Dano extra contra construtos/mortos-vivos? (esse é o nível que não tenho muitas ideias)
- Nível 14: Passiva - Usar Bonus Action pra fazer uma ataque que acertou virar um acerto crítico.
*Mais ideias para subclasses baseadas em Estilos de Luta: Mestre de Armas*
Subclasse de guerreiro semelhante ao Battlemaster, mas habilidades menores específicas para determinadas armas (talvez usar algumas das habilidades dos talentos pra armas do UA). Exemplos:
*Adagas de Arremesso:* Você pode sacar quantas adagas em um turno quanto tiver ataques. (by Raw, você só pode sacar uma arma em um turno durante seu movimento, sendo necessário a Ação Usar Item para sacar uma arma adicional.
*Chicote:* Quando você acertar uma criatura Grande ou menor com um chicote, você pode escolher não dar dano e puxá-la 1,5m na sua direção.
*Martelos:* Quando você tem um Acerto Crítico contra um alvo com uma arma heavy, ele cai.
*Sabre - Contra-ataque:* Se um inimigo melee errar um ataque contra você, ele recebe mod. Des dano perfurante.
*Lança:* você pode usar uma Ação Bônus para aumentar o alcance da lança em 1,5m até o final deste turno.
*Mangual Boladão:* Se você acertar um AdO com um Mangual, o inimigo cai.
*Espadas (longa e larga):* Você pode usar uma Ação Bônus se usou Ação de Ataque pra causar mod. Força em um oponente adjacente a você e ao inimigo.
Possivelmente uma habilidade que faça as armas darem dano mágico nas mãos do guerreiro ou até ter um bonus de +1 (mais do que isso é provavelmente muito fanz).
Resumindo o estudo de dano por turno só com bugs usáveis todo turno:
*Por dano Máximo*
Palada - 6d8+24, máximo 72, máxima efetiva 50
Guerrerão - 4d10+1d4+90, máxima 134, máxima efetiva 67
Ladinosafado - 12d6+36, máxima 108, máxima efetiva 54
*Por dano Médio*
Palada - 6d8+24, média 51, média efetiva 35
Guerrerão - 4d10+1d4+90, média 114, média efetiva 57
Ladinosafado - 12d6+36, média 78, média efetiva 39
_Vamo ver como fica o barbaroboladão_
*Por dano Máximo*
Barboladão - 2x(1d12+24), com bônus de +11, máxima 72 ou , máxima efetiva 37,2 (já considerando o crítico x5)
Barboladão Frenzy - 3x(1d12+24), com bônus de +11, máxima 108 ou , máxima efetiva 56 (já considerando o crítico x5)
*Por dano Médio*
Barboladão - 2x(1d12+24), com bônus de +11, média 60, média efetiva 30 (já considerando o crítico x5)
Barboladão Frenzy - 3x(1d12+24), com bônus de +11, média 90, média efetiva 45 (já considerando o crítico x5)
_Vamo ver como ficaria o barboladão com a certeza de um crítico por turno_
*Por dano Máximo*
Barboladão - 6d12+48, com bônus de +11, máxima 120 ou , máxima efetiva 54
*Por dano Médio*
Barboladão - 6d12+48, com bônus de +11, média 87, média efetiva 39
*Por dano Máximo*
Palada - 6d8+24, máximo 72, máxima efetiva 50
Guerrerão - 4d10+1d4+90, máxima 134, máxima efetiva 67
Ladinosafado - 12d6+36, máxima 108, máxima efetiva 54
*Por dano Médio*
Palada - 6d8+24, média 51, média efetiva 35
Guerrerão - 4d10+1d4+90, média 114, média efetiva 57
Ladinosafado - 12d6+36, média 78, média efetiva 39
Posta aí o que você quer arquivar
in discussion Descrição / Campanhas e Aventuras » O Destindo do Serpente Dourada
Eu estive pensando nos pontos que precisamos discutir agora que vai rolar as aventuras em Faralchar.
Primeiro Ponto: Quando fazer a passagem para Faralchar? Quando estiver todo mundo com seu personagem "final". Aos poucos?
Segundo Ponto: Usaremos as Regras de talento? Talentos são regras opcionais. Até agora temos usado eles, mas vai que alguém é contra por algum motivo.
Terceiro Ponto: O que vocês esperam para a Campanha e seus Personagens? Não digo algo definitivo, mas que rumo vocês esperam que a campanha leve. Isso está intrinsecamente ligado à história dos personagens e a ligação entre eles.
Quarto Ponto: Precisamos discutir algumas regras gerais. Upar vai exigir treinamento? Todas as regras do livro serão seguidas à risca? Por exemplo, eu gostaria de alterar a regra do Recovery Die para que eles sejam recuperados a cada descanso longo (pelo livro, cada descanso longo recupera metade dos Recobery Die)
in discussion Descrição / Campanhas e Aventuras » O Destindo do Serpente Dourada
Eu estive pensando nos pontos que precisamos discutir agora que vai rolar as aventuras em Faralchar.
Primeiro Ponto: Quando fazer a passagem para Faralchar? Quando estiver todo mundo com seu personagem "final". Aos poucos?
Segundo Ponto: Usaremos as Regras de talento? Talentos são regras opcionais. Até agora temos usado eles, mas vai que alguém é contra por algum motivo.
Terceiro Ponto: O que vocês esperam para a Campanha e seus Personagens? Não digo algo definitivo, mas que rumo vocês esperam que a campanha leve. Isso está intrinsecamente ligado à história dos personagens e a ligação entre eles.
Quarto Ponto: Precisamos discutir algumas regras gerais. Upar vai exigir treinamento? Todas as regras do livro serão seguidas à risca? Por exemplo, eu gostaria de alterar a regra do Recovery Die para que eles sejam recuperados a cada descanso longo (pelo livro, cada descanso longo recupera metade dos Recobery Die)
in discussion Descrição / Campanhas e Aventuras » O Destindo do Serpente Dourada
Neste tópico tentarei resumir os prós e contras de se jogar a aventura/camapnha O Maravilhoso Destino do Serpente Prateada com ambientação em Faralchar, cenário no qual venho (assim como outras pessoas também) trabalhando há muito tempo. Cada um dos prós terá seu contraponto logo abaixo.
Prós:
- As histórias dos personagens serão mais bem trabalhadas. Quando eu jogo uma campanha ambientada em Faralchar, eu levo a sério (às vezes até demais), ou seja, o que acontecer na campanha terá consequências no cenário em si. Os frutos das aventuras serão mais personalizados e duradouros. Eu tenho grande carinho pelo cenário e tentarei mostrá-lo ao máximo e de maneira imersiva ao jogador e personagem. Provavelmente farei "diários de aventura", como fiz com as outras campanhas que mestrei.
- Em geral, jogos em Faralchar são do tipo high fantasy, ou seja, estão ligados a batalhas épicas, confrontos praticamente divinos. Tal fato pode ou não estar ligado à mecânica do jogo (na 3.5, criei diversas regras da casa para diversificar e personalizar personagens, classes, regiões, etc; mas pretendo maneirar mais essas alterações na 5e). Mas, basicamente, qualquer coisa é possível.
- Gosto de alterar mecânicas, então é bem provável que eu crie caminhos (subclasses, círculos de druida, domínios de clérigo, escolas de magos…) e como regras da casa, o que poderá dar ao jogador mais opções para alcançar o personagem que ele deseja.
Contras:
- A diversão do jogador, muito provavelmente, será proporcional ao trabalho que ele dedicar ao personagem. Como nem todos querem ou têm tempo para investir no seu personagem (ou simplesmente gostam de variar muito de personagem na mesma campanha), pode ser que eles acabem não se divertindo tanto quanto quem pode incrementar o personagem. Se não jogarmos em Faralchar, as aventuras para mim serão mais como testes do sistema (isso não quer dizer que não darei importância a elas, mas também não me dedicarei ao detalhamento que sei que posso alcançar).
- Por se tratar de um cenário high fantasy, os riscos são maiores. Muitas vezes, haverão encontros mais difíceis que o comum. É comum que se classifique o high fantasy como um cenário cheio de magias e paranauês, mas não é isso que provavelmente vai acontecer (costumo de dizer que jogo um estilo de jogo high fantasy disfarçado de low fantasy, então é muito provável que os personagens sejam super poderosos, assim como os vilões, mas não será todo mundo que sai voando ou dando tp por aí).
- As regras da casa valem para os dois lados. Criarei uma quantidade alta de monstros e vilões diferentes para tentar equilibrar o poder dos personagens. Ainda, antes que alguém pense que isso é equivalente a power play, tentarei seguir ao máximo as recomendações do livro do mestre 5e para a criação de monstros e habilidades, tentando sempre equilibrar e tornar prático o jogo (itens que eu quase ignorava na 3.5).
Por enquanto é isso. Comentem aqui em baixo se quiserem adicionar alguma observação ou fazer alguma pergunta. Fiquem a vontade para navegar pelo site e conhecer melhor o cenário.
Att.,
Cássio.
Combate em Massa
O conceito de combate em massa é autoexplicativo. Neste pacote opcional, serão apresentadas algumas regras quando os combatentes são representados por grandes exércitos.
A ideia central do é simplificar as jogadas sem retirar a parte estratégica dos combates com muitas criaturas. Em primeiro momento, as regras a seguir estão de acordo com a quinta edição do D&D.
Escala
Cada unidade de combate possui entre cinquenta e cem homens, mas eles não estão agrupados de maneira regular (cada homem ocupa um espaço de um metro e meio por um metro e meio), levando cada unidade a ocupar um espaço linear de cinquenta metros em todas as direções. Observação: o uso do termo espaço linear foi proposital para poder ser usado tanto em quadrados como em hexágonos, estes que pretendo utilizar.
Com relação à escala de tempo, considera-se que cada rodada de combate dura vinte minutos. Caso seja necessário, o mestre pode alterar estas escalas para melhor conduzir o jogo.
Movimentação
A movimentação de um grande exército destoa grandemente da movimentação de criaturas solitárias. Tal fato explica a diferença de deslocamento nas unidades de combate, de acordo com a tabela de unidades e pode ser justificado pela dificuldade da movimentação em terrenos, mesmo os de fácil passagem, e da necessidade de se carregar equipamentos e suprimentos em quantidade maior do que grupos menores.
De maneira geral, os terrenos são de dois tipos: deslocamento normal e deslocamento difícil. Cada terreno de deslocamento normal necessita de um ponto de deslocamento para ser ocupado/ultrapassado. Cada terreno de deslocamento difícil custa dois pontos para ser ocupado/ultrapassado.
Note que há diferença nos termos Ocupar e Ultrapassar. Unidades especiais ou habilidades especiais podem alterar o custo para que uma Unidade Ocupe ou Ultrapasse um terreno.
Terrenos
Além da movimentação, os terrenos implicam em diversos outros bônus e penalidades. O mundo de Faralchar tem uma geografia bem diversa e cada uma delas apresenta suas próprias características.
Planícies
São os terrenos mais escolhidos para campos de batalha. São campos com vegetação baixa ou plantações dos mais variados tipos. Deslocamento Normal. Em planícies, não é possível a ação Esconder-se.
Colinas
São as formações de baixa altitude, geralmente resultado de diversas colinas em conjunto. Deslocamento Difícil. Unidades sobre Colinas têm sua visão ampliada em um. Quando em uma Colina, a unidade tem vantagem em Ataques contra alvos em Planícies.
Montanhas
São formações rochosas de altitude elevada. Montanhas não podem ser trespassadas a não ser que possuam uma Estrada. Não é possível a visualização dos terrenos diretamente atrás de montanhas.
Florestas
São formações de terra fértil que possibilitou o crescimento de alta vegetação, especialmente árvores. Deslocamento Difícil. Quando em Florestas, as unidades têm sua visão limitada a um. Unidades em Florestas têm vantagem em testes de Manobra para a ação Esconder-se. Unidades em Florestas têm +4 em sua Defesa contra ataques a distância.
Estradas
São estruturas construídas sobre terrenos que facilitam a movimentação sobre os mesmos. Quando um terreno apresenta uma estrada, o custo de Deslocamento para ocupa-lo é reduzido à metade.
Pântanos
São regiões de solo extremamente úmido, geralmente por brejos e nascentes em abundância. São terrenos de deslocamento difícil. Unidades em Pântanos têm desvantagem em todos os testes de Manobra.
Desertos
São regiões áridas em que o solo é predominantemente de areia. Terreno de deslocamento difícil.
Neve
São regiões de clima frio e geralmente cobertos por neve. Terrenos de deslocamento difícil.
Rios
São corpos de água de grande diâmetro. Terrenos de deslocamento difícil. Para unidades com deslocamento aquático (como navios), funciona como estradas, na direção da correnteza.
Oceanos
São corpos de água salgada de comprimento imenso. Não podem ser ocupados nem ultrapassados por unidades sem deslocamento aquático.
Lagos
São corpos de grande diâmetro de água doce. Não podem ser ocupados nem ultrapassados por unidades sem deslocamento aquático.
Da combinação de terrenos
De acordo com o julgamento do mestre, os terrenos podem ser misturados (por exemplo, uma colina com florestas), com a acumulação de suas diferentes características. Já as características do mesmo tipo não se acumulam.
Unidades de Combate em Massa
As guerras são travadas por exércitos e estes são formados por unidades menores independentes. Cada uma destas unidades possui estatísticas e características diferentes. A seguir uma breve descrição de cada estatística:
Ataque
Quando ocorre o embate entre unidades, o atacante deve realizar um teste de Ataque contra a Defesa do atacado. Caso o teste tenha um resultado positivo, o ataque foi bem sucedido. Mais informações serão esclarecidas no campo Ações.
Dano
Ataques bem sucedidos causam o dano indicado à unidade atacada, que retirará o valor respectivo de suas Perdas Aceitáveis.
Deslocamento
É a quantidade de quadrados/hexágonos que uma unidade dispõe para se movimentar em um turno.
Manobra
este atributo determina o quando uma unidade é eficaz em movimentar-se taticamente. Isso não tem necessariamente a ver com organização da unidade, mas sim com o treinamento em táticas de guerrilha e quantidade de equipamento carregado. O atributo é usado para testes das ações Esconder-se, Recuar, entre outras.
Defesa
Representa a capacidade de uma unidade em defender-se, seja por técnicas de combate ou por armaduras e escudos. É usada como dificuldade para testes de Ataque.
Moral
Representa a força de vontade dos guerreiros da unidade. Pode sofrer alterações causadas por bons (ou maus) comandantes e condições adversas do campo de batalha. Atributo usado em testes para evitar a ação Desbandar.
Perdas Aceitáveis
Representa o quanto uma unidade pode aguentar no campo de batalha de maneira minimamente organizada. Quando uma unidade perde guerreiros demais, ela pode Desbandar.
Retaliação
Não é possível atacar uma unidade inimiga em combate direto (corpo-a-corpo) sem sofrer um mínimo de dano direto. Sempre que uma unidade realize um ataque contra um inimigo adjacente (distância de um quadrado), ela sofre o dano de retaliação, sendo o ataque bem-sucedido ou não. Ataques a distância não causam retaliação.
Alcance
É a distância máxima que uma unidade pode atacar. Alcances de valor um quer dizer que a unidade só pode atacar inimigos adjacentes, enquanto valores maiores se referem a ataques a distância.
Unidades de Combate em Massa
Unidade | Ataque | Deslocamento | Manobra | Defesa | Moral | Perdas Aceitáveis | Dano | Retaliação | Alcance |
Camponeses Furiosos | +1 | 2 | +0 | 10 | +0 | 20 | 1d6+2 | 1d4-1 | 1 |
Milícia | +3 | 2 | +2 | 12 | +2 | 30 | 1d8+4 | 1d6 | 1 |
Regimento | +5 | 3 | +3 | 14 | +4 | 40 | 2d8+5 | 1d8 | 1 |
Batalhão | +4 | 3 | +5 | 13 | +4 | 30 | 2d8+2 | 1d8 | 1 |
Arqueiros | +4 | 3 | +3 | 13 | +4 | 30 | 2d8 | 1d6 | 2 |
Ações
Todas as unidades possuem ações a serem desenvolvidas em um turno de combate. É possível realizar um movimento (usando seu Deslocamento) e uma Ação em um mesmo turno. Salvo contrário (de acordo com a descrição da unidade/habilidade), a realização de uma Ação encerrará o turno de uma unidade, depois de verificadas as suas consequências (dano, retaliação, etc). Abaixo são descritas as ações mais comuns de uma unidade de combate em massa:
Engajar
É o ato de se preparar para um embate. Para realizar um ataque corpo-a-corpo, uma unidade precisar Engajar-se com a unidade inimiga. Em geral, é possível usar a ação Engajar juntamente com a ação Atacar. Enquanto Engajadas, as unidades não podem se movimentar normalmente, sendo necessário para tal o uso ou da ação Recuar ou da ação Desbandar. Ataques a distância não necessitam serem precedidos pela ação Engajar.
Atacar
Para ataques corpo-a-corpo, uma unidade pode atacar outra inimiga que esteja com ela engajada em combate, é realizado um teste do atributo Ataque da atacante contra a Defesa do alvo. Caso o ataque seja bem sucedido, o alvo recebe o Dano da atacante enquanto esta, sendo o ataque bem sucedido ou não, recebe a Retaliação. Ambos Dano e Retaliação são descontados das Perdas Aceitáveis das unidades envolvidas.
Para ataques a distância, é realizado um teste de Ataque contra um alvo dentro do Alcance da unidade atacante. Um ataque bem sucedido causa Dano na defensora, mas não há qualquer tipo de Retaliação.
Defesa
Uma unidade pode escolher usar a ação Defesa para usar de posicionamento e tática – e também barreiras de escudos – de maneira a dificultar o ataque de unidades adversárias. Enquanto a unidade defensora não realizar outra ação, nem mesmo movimentar-se, sua Defesa cresce em 2 pontos. O dano de Retaliação à unidade atacante é aplicado normalmente.
Esconder-se
Unidades podem tentar, nas adequadas condições, tentar camuflar-se e esconder-se usando a ação Esconder-se. Para realizar esta ação, a unidade não pode estar no raio de visão de inimigos, caso em que a ação falha automaticamente. A unidade realiza um teste de Manobra e anota o resultado. Inimigos que tenham a unidade escondida em seu raio de visão devem fazer um teste de Manobra contra o resultado anotado para notar a unidade escondida. Unidades escondidas têm vantagem em testes de Ataque contra inimigos que não as tenham visto. Realizar outras ações ou mover-se cancelam os benefícios da ação Esconder-se.
Recuar
Uma unidade engajada em combate não pode se mover normalmente. Para realizar qualquer tipo de deslocamento no campo de batalha (em geral para fugir de um combate), a unidade deve realizar a ação Recuar. Através desta, a unidade deve realizar um teste de Manobra resistida contra a Manobra das demais unidades engajadas e, caso bem sucedida, a unidade pode usar seu deslocamento normalmente. Ainda, até o início do próximo turno da unidade que está recuando, é necessário um teste resistido de Manobra para o uso da ação Engajar contra a unidade em recuo. Não é possível usar a ação Recuar se a unidade já usou seu deslocamento naquele turno.
Desbandar
Quando as Perdas Aceitáveis de uma unidade chega a zero, esta unidade não é imediatamente eliminada, mas se encontra em um estado desorganizado. A cada turno a unidade desorganizada deve tentar usar a ação Desbandar, que indica os soldados restantes tentando escapar do campo de batalha com vida. Em seu próximo turno, a unidade deve realizar um teste de Moral com dificuldade 5 mais o dano excedente (PA negativo) atual; se for bem-sucedida, ela consegue organização suficiente para realizar uma ação com desvantagem em eventuais testes; se for mal sucedida, o a dificuldade no próximo turno será acrescentada em 2. Ataques adicionais à unidade desorganizada aumentam a dificuldade do teste de Moral. Falhar por três vezes no teste de Moral ou alcançar PA negativo igual ao seu PA original significa que o que restou da unidade está a mercê do inimigo, cabendo a ele decidir o seu destino (extermínio ou aprisionamento, geralmente).
Visão
Salvo especificações em contrário, as unidades de combate em massa têm raio de visão de 2 quadrados em todas as direções do terreno ocupado.
Sangue e suor brindavam na arena. A multidão bradava em desalinho com a integridade física dos gladiadores. Dois homens duelavam em uma dança mortal, armados de lanças ponteadas por bronze tendo apenas uma placa peitoral do mesmo material e um grande escudo de madeira para defender-se dos terríveis golpes de seus adversários. Com um passo para o lado, Kilaf desviou-se de um ataque frontal, evitando que a arma inimiga penetrasse seu ombro, mas o adversário foi rápido o suficiente para mover a haste para a direita em tempo suficiente para rasgar sua pele. Os espectadores gritaram enquanto o sangue saltou para fora.
Com o líquido vital escorrendo pela parte externa do braço hábil, Kilaf saltou para frente. Levantou o braço rapidamente e o sangue saltou para a areia. Seu inimigo prontamente preparou em frente ao tronco, protegendo-o de uma perfuração vindoura. Mas não era essa a intenção. Com os músculos gritando com o movimento rápido exigido, a lança girou e mudou de direção, acertando o oponente na cabeça com a haste. O gladiador atingido cambaleou atordoado pelo golpe certeiro na têmpora esquerda, dando a seu atacante um momento de liberdade usado para atiçar a multidão alvoroçada.
- Você me mandam fazendeiros e criadores de porcos! – Kilaf sabia que o show era muito importante para agitar a arena e desmerecer seu adversário era parte disso – Me chamem quando encontrarem um homem de verdade para lutar nessas areias!
A plateia gritava cada vez mais alto. Aqui e ali, alguns gritavam: Kilaf! Kilaf! Mas era Trahark que parecia mais satisfeito por um trabalho bem feito. Ao lado do meio-orc um homem coberto em um manto preto chamou a atenção do guerreiro. Era um negro de olhar perscrutador, com a pele castigada pela idade e pelo sol e o cabelo já ralo, fino e branco. Mas sua expressão não era aquela de um idoso comum, ele parecia muito mais interessado na luta que a histérica audiência. Em um minuto, seu olhar pareceu cruzar com o gladiador e no outro a dor floresceu.
Recuperado da concussão e tomado pela raiva, o criador de porcos aproveitou a distração de seu adversário para atacá-lo com um golpe direto usando toda sua força. A ponta de bronze acertou em cheio a placa inimigo, amassando-a e desviando-se para a esquerda riscando o metal para finalmente alojar-se em tenra carne em um ferimento profundo no interior do braço de Kilaf. O grito de dor inflamou a multidão mais do que parecia ser possível. O gladiador ferido saltou para frente, livrando-se da lança ensanguentada e constatando que o braço não teria mais utilidade para aquele confronto. Desafivelou o escudo, que caiu na areia com um baque.
- Dez moedas no criador de porcos! – gritou um apostador exaltado. E um turbilhão de apostas se seguiu. Mas Trahark abria um sorriso ganancioso.
Havia três semanas que os ferimentos em seu peito haviam cicatrizado totalmente, fazendo com que Kilaf voltasse ao treinamento de combate com o meio-orc e colocado para lutar uma dezena de vezes em nome de Mão d´Ouro, muitas vezes sem a presença deste. O bárbaro estava geralmente preocupado em lançar-se ao saque de vilas próximas e distantes, dividindo sua horda de maneira bastante estratégica, para um rufião. Na maioria das vezes, o gladiador vencia seus oponentes com facilidade, devido ao seu prévio treinamento em armas e aos sábios conselhos do feitor. Mas era nas lutas mais difíceis que o rendimento das apostas era maior. No começo dos combates, Mão d´Ouro mandava Salko ou outro de seus capangas para apostar, mas logo Trahark mostrou-se mais eficiente no serviço, sendo apenas escoltado por quatro ou cinco bárbaros que mantinham a certeza que seu gladiador, sua mais nova fonte de renda, não escaparia de suas mãos. Ao final de cada luta, parte das moedas arrecadas iam para os curandeiros, Illa entre eles, responsáveis por tratar dos constantes ferimentos sofridos.
A perfuração era profunda e vertia sangue incessantemente, indicando que o gladiador deveria derrotar rapidamente seu inimigo ou seria atingido por uma intensa fraqueza. Seu oponente sabia disso doravante tomando uma posição defensiva: escudo a frente e lança por cima dele, revelando apenas as pernas abaixo do joelho e a parte superior da cabeça com uma grande mancha rocha na têmpora, que já começara a inchar. Com apenas uma mão hábil, Kilaf sabia que teria que encontrar um jeito pouco ortodoxo para vencer.
Correu diagonalmente para a direita, mas seu inimigo usou uma estocada para afastá-lo. Abaixou-se e girou em seu próprio eixo, tentando acertar as pernas do adversário com a ponta da lança, mas este baixou o escudo bloqueando o ataque e quase foi bem-sucedido no contra-ataque com a própria lança. E então soube o que tinha que fazer. Kilaf preparou a lança por cima da cabeça, a multidão calou-se diante do movimento inesperado. Arremessou-a com todo o peso do corpo, dando velocidade suficiente para que o inimigo fosse obrigado a bloquear e não desviar-se. O bronze encontrou a madeira com um estalo, a lança abrindo caminho no material e fincando-se lá. Assustado, o criador de porcos olhou por cima do escudo logo após constatar que não havia sido ferido. O que viu foi pior: Kilaf já estava a sua frente, sem deixar espaço para manobrar corretamente a lança, ou sequer tempo. O gladiador sem escudo agarrou a arma fincada e jogou seu peso sobre o oponente que cedeu e caiu nas areias com um baque, junto com seu adversário. Percebendo que com apenas um braço não seria capaz de fazer a lança perfurar a placa peitoral do inimigo, Kilaf agarrou o escudo em sua parte superior firmemente com o punho e forçou a madeira contra a mandíbula do criador de porcos com tanta força que trincou osso e madeira como se fossem do mesmo material.
Afogando-se no próprio sangue, o gladiador inimigo soltou sua lança e levou a mão direita à boca. O escudo ainda preso pelo peso de Kilaf. Este que prontamente agarrou a arma do inimigo pelo meio da haste. Apontou a ponta de bronze obliquamente ao pescoço do criador de porcos. E como um porco ele foi sacrificado com uma perfuração laringo-craniana.
Em sua visita aos curandeiros, o homem de preto apresentou-se novamente à visão de Kilaf. Aquele viu Trahark ao lado do gladiador e assumiu que fosse seu proprietário.
- Quanto quer por esse homem? – sua voz era grave e muito calma, sua fala quase parecia um sussurro.
- Não sou o proprietário – respondeu Trahark – Mão d´Ouro é.
- Aquele mercenário de uma figa! Da última vez que fiz negócios com ele, me cobrou o dobro do preço desse mercado todo por um pedaço inútil de papel. – então caminhou até o gladiador e o encarou firmemente, analisando-o de cima a baixo – Mas talvez este aqui valha o esforço desagradável de conversar com dito cujo.
- Você tem culhões, velho. – disse o meio-orc – Cuidado pra não tropeçar neles.
O homem de preto saiu rindo, repetindo para si alguma piada envolvendo suas partes íntimas e sua idade.
Naquela noite, Majin veio à tenda dos escravos que continha todas as celas dos homens e mulheres de propriedade do líder bárbaro. Mão d´Ouro até que tratava bem seus escravos, enquanto valessem o suficiente, pois os outros mestres de escravos frequentadores do mercado jogavam seus serviçais em celas comunitárias sem teto e os faziam lutar por comida.
- Tem um cara querendo te comprar, chefe! – disse o ladrão num misto de alegria e tristeza – Pelo menos assim você tira essa ideia da cabeça… Mas dizem que o velho é um feiticeiro. Caolho não gosta dele, diz que ele cheira a mijo de Barghest, seja lá o que isso for. Até Mão d´Ouro parece incomodado na presença dele.
- Ele mencionou algum nome? – Kilaf estava pouco interessado em conversas de feitiçaria e superstições.
- Amerus, Âmiro, algo assim.
- Âmero – o homem, ainda coberto de preto adentrou a tenda dos escravos de supetão, assustando Majin nitidamente – Pelo menos é assim que me chamam agora. Tenho vários nomes, é útil para alguém como eu.
Descontraidamente, o suposto mago caminhou até o gladiador e seu companheiro, alheio tanto ao olhar dos dois quanto dos outros escravos em suas respectivas celas. Usou a caixa em que se situavam as armaduras e armas de Kilaf como assento, reclamando sobre a dor nas juntas, mas pouco expressando tal incômodo.
- E qual seria a sua graça? – dirigiu-se ao gladiador.
- Minha o que? – já ia indagando o escravo, mas então percebeu que era seu nome o que perguntava – Ah! Kilaf.
- Kilaf!? – Âmero parecia surpreso e estranhamente satisfeito – E você sabe o que isso significa, garoto?
- Bosta na língua dos orcs, sim claro…
- Bosta!? – o mago desatou a rir descontraidamente, como se fossem amigos de longa data, algo naquele homem era estranhamente familiar, ele possuía uma simpatia sobrenatural que despertava admiração nas pessoas; Kilaf imaginou se seria por isso que o taxavam de feiticeiro – Não, não, garoto! Quer dizer lança e em élfico, também usado como título para soldados que se provam em batalha nas lutas deste povo. Fico imaginando quem poderia ter lhe dado tal nome. Não sua mãe, não, com certeza não foi ela…
- O que você quer? – perguntou o gladiador, impaciente, mas ainda surpreso pela mentira de Trahark, imaginando por que o teria chamado assim. Âmero abriu um pequeno sorriso.
- Vamos direto ao ponto então? Como queira. Eu vi você na arena, luta bem até. Gostaria de comprá-lo, mas o maldito bárbaro quer cinco mil moedas. Nem que você fosse o próprio Askardin eu pagaria tanto, sem ofensa. Então eu vim aqui libertá-lo.
Majin pulou no lugar, seus olhos tão esbugalhados que parecia que estourariam a qualquer momento. Kilaf estava incrédulo diante da estranha e perigosa proposta, pensando que era alguma espécie de truque, mas o feiticeiro não vacilou por momento algum, tornando uma mentira pouco provável.
- Não quer ser livre? – indagou Âmero, incisivo.
- Para dever essa liberdade a você?- replicou Kilaf.
- Gostei de você, garoto – voltou o mago a sorrir – Na verdade, estava procurando alguém como você. Existe uma profecia em específico que eu pretendo ver cumprida, e você se encaixa na descrição.
- Não acredito em profecias.
- Nem eu – disse o mago, rindo – Mas quando se tem a minha idade, as pessoas costumam procurar algo para ocupar o tempo. Profecias são interessantes, mas tão reais quanto se esforce para que sejam. Você bem sabe que as pessoas são muito supersticiosas, como seu amigo aqui, então é mais fácil conseguir algo grandioso se isso foi dito por um louco qualquer centenas de anos antes.
Majin olhava estupefato de um para o outro, como se aquela conversa não fosse para ele. Kilaf pressentia que havia coisas que Âmero não estava revelando. Deve ser assim que os supostos feiticeiros convencem as pessoas a fazer o que eles bem entendem, isolando-se de culpa, pensou.
- E que profecia seria essa? – perguntou o gladiador, pouco interessado.
- Que importa? – o interlocutor abriu um sorriso – O importante que você se encaixa nela, posso ler nos seus olhos. Ou vai me dizer que você não um guerreiro culpado de um crime brutal buscando extraviar seus pecados através da própria brutalidade e dominado por um lobo faminto que almeja devorar um dragão dourado?
Majin saltou, cheio de medo, mas agora levou a mão à adaga, preparado para um combate, ou talvez esperando ser vítima de algum poder antigo que o explodiria em mil pedaços.
- Você está inventando tudo isso! – disse finalmente o ladrão de galinhas, estranhamente sem gaguejar por um só instante e sem a mínima hesitação.
- E finalmente a serpente mostra suas presas – diz Âmero perscrutando Majin – Você é mais do que parece ser, não é?
- Como você sabe de tudo isso, feiticeiro!? – Majin parecia outra pessoa, sacando sua adaga e apontando-a com presteza para o mago.
- Oras, porque eu sou um mago – Âmero levantou altivamente e posicionou-se diante do ladrão e sua lâmina; impassível, ele caminhou lentamente de encontro com a arma até quase tocá-la – Agora controle-se e guarde essa arma.
Abalado, Majin afastou-se e guardou sua arma. Kilaf não sabia o que era mais surpreendente: Majin agindo resolutamente ou o fato de as palavras de Âmero terem um efeito tão forte sobre ele. Ainda calmo, o mago recuperou sua expressão amigável e voltou a sentar na caixa de armamentos.
- Acho que acertei em cheio, então. De qualquer maneira, já percebi que tem coisas que você precisa fazer antes de libertar-se. Mas antes de deixar o acampamento eu vou ajudar você.
E, como se estivesse tudo resolvido, Âmero levantou-se e dirigiu-se para a entrada da tenda.
- Como assim? – perguntou Kilaf, interrompendo os passos apressados do mago.
- Mago é aquele que faz as coisas acontecerem. Mas um bom mago não precisa de poder místico nenhum para isso.
- Âmero! – interrompeu novamente Kilaf – Eu pensei que magos tivessem nomes mais impactantes. Talvez Theros ou mesmo Arcon.
- Nem em mil anos! – gargalhou o mago, brincalhão, enquanto atravessava o portal de tecido – Ou talvez só então.
A alvorada chegou como um raio, mas Kilaf não conseguiu dormir, pensando se o que Âmero tinha dito era apenas parte de um grande truque. Em algum lugar bem profundo em seu âmago, torcia para que não fosse trapaça nenhuma, mas seu realismo racional o puxava para uma razão muito menos pitoresca. Majin não o visitara naquele dia, nem em muitos seguintes. O treino com Trahark foi pesado como sempre e quando questionado sobre a questão de seu nome de gladiador, o meio-orc apenas atacava com mais força. Ao final do último embate que travaram, vertiam suor e sangue dos ferimentos recentes do escravo. Trahark, apesar de também cansado, mostrava-se muito mais apto para continuar lutando.
- Nomes são muito importantes, Kilaf – disse finalmente o feitor – Guarde todos os seus com cuidado e orgulho, pois é deles o papel de definir o homem que você é, assim como sua técnica com a espada representa o guerreiro que é.
- Mas por que mentir? – replicou o gladiador, agora ainda mais confuso – Também não entendo o tratamento tão duro, sendo que claramente suas palavras não correspondem com suas expectativas.
- Você não lutou mais avidamente com a esperança de me derrotar e engolir todas as vezes que te chamei de monte de bosta? Não gravou mais facilmente na memória todos os ensinamentos disfarçados em insultos? Seu orgulho me foi evidente desde a primeira vez que me encarou com aqueles olhos cheios de raiva e repulsa. Quebrar a estabilidade emocional de um homem orgulhoso é o passo mais importante para endurecê-lo e fortalecê-lo.
- Afinal quem é você? Todos à minha volta parecem ser pessoas completamente diferentes do que foram ontem.
- Portamos máscaras dos mais variados tipos, tamanhos e cores. Mas cada homem protege seu verdadeiro eu como um guerreiro protege o próprio coração. Afinal, ninguém quer ter seu coração ou seu verdadeiro eu arrancado à força e exposto a seus inimigos. Use suas máscaras como usa seu escudo e talvez um dia aprenda que a vida é um eterno campo de batalha, mas muito mais rebuscado e complexo. Eu? Eu sou Trahark e conquistei minha liberdade como você deseja conquistar a sua. E temo que chegará à mesma conclusão que eu: sempre estamos presos compulsivamente a algo e que obsessões muitas vezes têm garras mais fortes que as algemas que prendem seus pés.
O feitor parecia longe, absorto em seus próprios pensamentos e nenhum outro ensinamento foi passado naquele dia. No seguinte, Kilaf teria uma luta comum na arena, mas Mão d´Ouro estaria lá para assisti-la, tornando impossível não pensar que Âmero estava planejando alguma coisa para fazê-lo escapar ou, em um sonho mais doce, abrir um espaço para que o gladiador pudesse matar seu captor.
- … e seu campeão, Kilaf! – Ulthur já estava completamente curado, mas sem seu cruel chicote farpado; devido ao combate de dois dias atrás, agora muitos gritavam pelo nome do gladiador, que vestia seu peitoral de bronze, escudo e portava uma nova lança – Lutem!
Grande e surpreendentemente obeso era seu adversário. Usava espada e escudo, mas nenhum peitoral poderia servir-lhe tornando a luta um pouco mais fácil. Com um adversário tão lento, dezenas de vezes Kilaf o feriu nas pernas, mas a gordura do sujeito parecia feita de ferro e pouco sangue lhe escapava. O guerreiro aproveitou o tempo que o monstro usava para respirar longas e sonoras golfadas de ar para exibir-se para a audiência. Agora já mais da metade da multidão gritava Kilaf! Kilaf!
E foi quando ele viu o homem esguio e visivelmente desnutrido. Era um dos mendicantes do acampamento, com toda certeza. Ele veio pelo lado norte da arena, direcionado para o sudeste: rumando para o palanque, algo em suas mãos pálidas e magras refletia a luz do sol vespertino. Percebeu então que faziam todo o sentido as palavras de Trahark: obsessões têm as garras mais fortes. Correu por cinco metros, tomando velocidade suficiente. A lança voou na direção de Mão d´Ouro, mas o único sobressalto permitido ao líder bárbaro foi arregalar os olhos. Ponta de bronze e haste passaram por cima de seu ombro esquerdo, acertando o assassino subnutrido que morreu sem ter tempo de sentir dor.
O silêncio imperou na arena pela primeira vez em muito tempo. Foi cortado apenas pelo grito de guerra do gladiador obeso, que corria desajeitadamente contra o oponente desarmado. Kilaf desviou a ponta da espada com o escudo, tirou o corpo fora da linha de momento do atacante, deixando apenas uma perna. Flácido e gigantesco, o inimigo caiu ao chão e levou um chute na cabeça tão forte que perdeu os sentidos por horas a fio.
Ninguém vai mata-lo! O lobo faminto morrerá pelas minhas mãos e pelas minhas mãos apenas. Era só o que pensava. Pelo menos até voltar o olhar para onde minutos antes avistara pela primeira vez o assassino subnutrido. Um idoso negro com cabelos ralos e brancos sorria para ele. Maldito feiticeiro!
Naquela noite, porém, uma escrava aqueceu sua cama. Mas para Kilaf o mais importante era algo mais: apenas a pele feminina o atrelava àquela cela.
Salko foi quem o tirou da arena. Quando Kilaf tentou atacá-lo, o bronze de sua espada estilhaçou-se no aço do Lobo Negro. Claro, escravos não valiam o preço do aço e armas de bronze eram muito menos perigosas e suscetíveis a quebras contra armas de verdade. Entretanto, a raiva ainda lhe tomava a mente e atacou com punhos e dentes o novo captor, mas seu inimigo estava munido de armadura, se é que aquilo podia ser chamado de armadura, de couro reforçada com malha metálica nos pontos mais vitais. O bárbaro golpeou o gladiador com o pomo de sua arma levando-o ao chão, atordoado. Então nenhuma rebeldia mais teve qualquer sucesso, até que desistiu e deixou-se levar até sua senhoria.
Os acampamentos ficavam nos arredores da praça mercante. No lado oeste foram montadas as tendas pertencentes aos homens de Mão d´Ouro. A tenda deste ficava rodeada das de seus mais estimados soldados, incluindo Salko e Caolho, além de outros cinco homens tão desprezíveis quanto. Em geral, os homens comuns da horda dormiam em grandes barracões comunitários e faziam suas necessidades em grandes baldes que eram posteriormente jogados nos espaços entre os logradouros, dando ao ambiente um terrível cheiro de excremento, suor e carne em decomposição. Ao passar pelos acampamentos bárbaros, Kilaf podia ver corpos sendo arrastados de um lado para o outro para serem queimados em piras fora dos limites do acampamento principal. Mas também haviam corpos jogados aqui e ali despreocupadamente, escravos predominantemente; em geral seus carregadores queriam apenas passar a responsabilidade de queimar os corpos para outros. Doentes e mendigos imploravam por comida e ajuda, recebendo chutes e cuspes ao invés.
Mas aquele horror Kilaf já esperava, o que o surpreendeu foi a diversidade de pessoas ali. Orcs, humanos, elfos e anões de todos os tipos eram encontrados aqui e ali vendendo e comprando; muitos eram escravos, mas nem todos; na verdade era difícil até contabilizar se a maioria era de escravos, pois muitos não usavam correntes e andavam livremente. Grandes orcs do vale de Karen-Dhar, homens negros do leste, elfos esguios do outro lado do mundo e inclusive um albino de olhos azuis escuros, anões tão largos quanto tonéis da cerveja que comercializavam eram apenas exemplos da dinâmica racial.
Mão d´Ouro estava diante de sua tenda, com Majin a limpar suas botas quando chegaram. Correntes prendiam suas mãos unidas, mas seus pés estavam livres para uma investida suicida. Estava esperando o momento até então e a visão de seu senhor desencadeou a raiva necessária para correr até ele, indiferente à presença de Salko armado as suas costas, seu sangue bombeando tão rápido que ele podia ouvir suas artérias ribombando por dentro de sua cabeça. Estava a meio caminho de seu destino quando Trahark deixou-o passar, apenas para agarrá-lo pelo ombro e colocar uma faca negra em seu pescoço. Parando imediatamente, o meio orc jogou seu peso sobre o de Kilaf, jogando ambos ao chão.
- E eu pensando que você tinha alguma coisa entre as orelhas, monte de bosta – sussurrou o treinador de escravos baixo o suficiente para que apenas o homem imobilizado sob seu corpo escutasse – Você não sabe de nada mesmo. Quer sua vingança? Lute por ela, mas lute direito: com palavras falsas e obediência. Porque tudo que você vai conseguir com esse ímpeto é sua própria morte.
Dito isso, esmurrou Kilaf com o punho esquerdo, pôs-se de pé trazendo o gladiador consigo e guardando a arma negra. Aprumou-se e fez uma pequena reverência ao seu contratante.
- Esse é um monte de bosta sem noção do perigo, meu caro cliente – disse o meio orc ao bárbaro – Serão necessários mais dias de treinamento para que ele se torne plenamente obediente e morra com lucro para o senhor.
- Portanto eu deveria manter seus serviços por mais tempo? – disse Mão d´Ouro em tom de chacota.
- Ma-mas… – disse Majin, embaralhando-se, a presença dos bárbaros ainda o incomodava intensamente – Mão d´… Senhor, você prometeu a liberdade para o vencedor!
Todos riram. Menos Majin e, claro, Kilaf. Mantiveram-se em silêncio por motivos distintos, porém: um por indignação e medo, o outro por já saber a trama do líder bárbaro há muito.
- Ora – replicou Mão d´Ouro – Como eu posso dar a liberdade para alguém que agora mesmo tentou me matar?
Kilaf apertou ainda mais o punho. Os dedos pressionaram tanto a pele de sua mão que as unhas abriram pequenos ferimentos. Dois pingos de sangue foram ao chão. Trahark posicionou-se a frente dele, impedindo qualquer outra tentativa suicida. Gladiador e bárbaro enfrentavam-se em uma luta de olhares. Este continuou:
- Mas como sou misericordioso, farei dele meu servo pessoal. Ainda terá de lutar quando eu assim desejar, mas não vai sofrer nas mãos de Salko ou Caolho se assim não for minha vontade. Entretanto, esse pequeno desentendimento de hoje não pode passar impune. Acho que dez chibatadas lhe ensinará alguma gratidão. Salko…
- Eu imploro para ter a honra – Trahark interrompeu – Sinto como se tivesse responsabilidade por esse monte de bosta.
- Porra de bode! – exclamou Salko atrás deles – O fudido quer mesmo o dinheiro do primo!
- Pois é, Salko – disse Mão d´Ouro, rindo – Uma ganância digna da vagabunda humana que o pariu. Vá procurar outro trouxa, meio-orc.
- Ela era uma vagabunda mesmo! – disse Trahark, disfarçando a ofensa pelo termo “meio-orc”, que ele odiava – Sua mãe mesmo me disse certo dia que elas trabalhavam juntas.
O líder bárbaro parecia que ia convulsionar de tanto rir. Kilaf imaginou que provavelmente seria menos temível vê-lo sério com aquele olhar irônico no rosto.
- Mas eu não sabia que as vacas da sua terra eram douradas. Mão de ouro uma ova! – continuou Trahark, mais confiante – Mão de vaca combina mais com você. Mas veja bem, não é só pelo dinheiro. Eu não gosto de treinar gladiadores para morrerem na arena, sinto prazer em transformar montes de bosta em montes de ouro. E confio tanto em minha capacidade para tal que aceito ser pago apenas com metade do que ele ganhar na arena!
Ainda rindo, Mão d´Ouro pareceu mais interessado. Esperou que todos os seus homens terminassem de gargalhar com as tolas brincadeiras e aceitou o trato. Trahark levou o escravo até um poste de carvalho entalhado com marcas de unhas e manchado com sangue e vômito. Do topo do pilar de madeira pendiam correntes com algemas. Preso com os braços para cima e encarando de perto o poste, ouviu quando o meio-orc estalou o chicote como que testando o instrumento para a punição. Esperava que esta arma não tivesse sido adornada com farpas ou estilhaços de vidro, pois seu corpo já estava bastante ferido. O vergão do castigo anterior ainda ardia em suas costas, mesmo que não mais vertendo o líquido vital. Contusões e luxações espalhavam-se por seu corpo, marcando sua terrível marcha e marcando na pele os maus tratos sofridos até então. Mas era o corte em seu peito que mais o preocupava; o sangue secara, mas um cheiro putrescente já subia às narinas e qualquer esforço poderia abrir o ferimento novamente. Uma infecção naquele lugar com certeza o mataria.
O primeiro golpe o tirou de seus pensamentos temerosos lembrou-o da vida pela dor. A arma de couro trançado trouxe sangue a tona, juntamente com a ardência do fogo. Trahark preparou o segundo golpe e o puniu novamente. Vomitou na quarta chibatada, uma mistura de migalhas de pão, água e seu próprio ácido. Um sabor rançoso invadiu sua boca. Mais uma vez o chicote estalou e os joelhos falharam, empurrando o corpo contra a madeira e sujando-o com o próprio vômito. Um grito lembrou-o do ferimento no peito, que voltara a abrir quando bateu contra a madeira. Tremia o corpo com o castigo e vagava a mente em uma estranha jornada entre o real e a ilusão. Em certos momentos o poste transformava-se no gigante nórdico olhando-o com grandes órbitas preenchidas apenas com sangue. Na oitava chibatada ele viu a mulher de amarelo entre a multidão que assistia o castigo. Tentou procurá-la com o olhar, mas a sombra dela pairava rapidamente de um lugar para o outro. Quando finalmente conseguiu focar a atenção nela, seus doces lábios mexiam-se, mas não diziam nada. E a nona chibatada o levou para a escuridão.
Quando acordou, o décimo golpe não parecia estar gravado em sua mente. Apenas a dor restava. Uma dor profunda, localizada desde o mais distante fio de cabelo até o interior dos ossos. Amarela: era assim que o sofrimento de então ficou gravado em sua mente. Amarelo fogo. Deu por si gritando enquanto um pedaço de ferro em brasa queimava seu corpo. O metal afastou-se, levando parte da dor com ele e deixando para trás exaustão e arquejo.
- O que? Onde? – tentou dizer, sem conseguir colocar muita coerência nas perguntas.
Uma senhora vestida toda de branco estava sobre ele. Tinha aproximadamente cinquenta anos; manchas de sangue decoravam o tecido branco em seu corpo; os braços e até a parte inferior do rosto estavam enfaixados com tiras de seda branca. Uma vestal, Kilaf percebeu imediatamente.
A experiente mulher fazia parte de uma antiga ordem dedicada à medicina e ao tratamento das mais variadas enfermidades, físicas ou não. Também tratavam para que os mortos descansassem de maneira digna. Tullï era sua matrona, a Deusa da Vida e da paz. Dizia-se que elas trocavam tudo de bom que a vida poderia oferecer por uma vida de obediência aos ensinamentos da deusa e supostos poderes mágicos. Elas viviam em templos dedicados a sua matrona e tratavam dos feridos e mortos em geral sem cobrar absolutamente nada. Eram as poucas mulheres respeitadas em um mundo tão cruelmente machista.
Mais surpreendente que o fato de que aquela mulher era uma vestal era sequer pensar na possibilidade de ela estar em um lugar como aquele. Kilaf sempre pensara nas vestais como mulheres indefesas que deviam ser protegidas por seus dons curativos. Mas aquela mulher não parecia nada indefesa, mesmo desarmada. Para falar a verdade, era a primeira vez que olhava com atenção para uma vestal, nunca antes seus ferimentos tinham sido tão extensos e variados, mas lhe parecia que a explicação ia além disso.
- Você ainda está no acampamento – respondeu ela, austera – Vivo, pelo menos por enquanto. Esse corte que você conseguiu aí vai infeccionar. Aqui, aplique estas ervas em cataplasma todas as manhãs e à noite. Tenha mais cuidado.
- Sou um escravo… – disse Kilaf, aparentemente a mulher ainda não tinha percebido.
- Eu sei – ela respondeu apontando para as correntes nos pés dele; exausto que estava, nem chegou a perceber os ferrolhos – Escravo ou não, tome mais cuidado. E um banho sempre que possível.
A naturalidade daquela mulher era espantosa. Ela não parecia ser uma escrava. Percebendo que estava sendo encarada, a vestal respondeu à pergunta não imposta.
- Não sou escrava, se é isso que está pensando. Pelo menos não exatamente. Não concordo com nada que acontece aqui, muito menos com homens tratando a seus iguais com relação de posse e senhoria. Mas é aqui que devo estar, que escolhi estar – ela levantou-se e checou a temperatura do paciente com a mão em sua testa. Satisfeita, dirigiu-se para a abertura da tenda e disse para alguém de fora – Você pode vê-lo agora.
A sacerdotisa deu passagem a um homem esguio, vestido em calças de couro desbotado muito grandes para ele e uma camisa de algodão manchada de muitas cores. Nas mãos, faltava-lhe o indicador esquerdo e um meio sorriso estampava sua face.
- Eu pensei que você ia morrer, chefe!
- Majin? – a claridade que entrara subitamente pela abertura da tenda o tinha ofuscado suficientemente para que não distinguisse até então o rosto do ladrão de galinhas – O que você está fazendo aqui?
- Foi ele quem te trouxe – disse a vestal, o jovem concordou com a cabeça.
- Eu pensei que você tava morto – disse finalmente – Tive que correr com você nas costas por metade do acampamento, até achar a Illa. Mão d´Ouro ficou assistindo tudo, mas não fez nada. Então eu tive que te carregar. Ele até mandou o Salko atrás de mim, mas o grandalhão não ajudou nada.
Kilaf deixou a cabeça cair no colchão duro de mato entrelaçado. Só de ouvir o nome do líder bárbaro, uma dor de cabeça o invadiu raivosamente.
- Eu vou matá-lo. – sentenciou finalmente, para um cada vez mais temeroso Majin e para a desinteressada Illa – Eu vou matá-lo sem piedade.
- Ele… Ele não é tão ruim, chefe – começou o jovem esguio – Ele não matou a gente e…
- Não! – interrompeu Kilaf – Ele fez algo muito pior. Ele nos transformou em nada. Seja quem for que éramos antes, não mais o somos. Toda nossa dignidade, esperança, sonhos… Ele nos tirou tudo isso. Fez isso a nós e sabe-se lá quantos mais. Eu preferiria morrer a ser escravo!
- Não se engane – disse Illa sem sequer olhar para ele, mas em um tom calmo e grave que impunha respeito e sabedoria – Eu já vi muitos tipos de homens. Escravos, aventureiros, soldados, camponeses, ricos, pobres, todos os tipos. Vi-os em enfermidade e em seus leitos terminais. Tantas histórias diferentes, tantas personalidades diferentes. Mas em algo todos eles eram iguais. Nenhum queria morrer. Eles poderiam enganar aos outros e a si mesmos, mas em seu fim derradeiro, todos clamavam pela vida. É triste quando penso nisso, e já pensei muitas vezes, mas é verdade. Todos nós tememos a morte e seu abraço. Por isso fugimos dela da melhor maneira que podemos. No final, somos tão ignorantes como os animais, tememos como eles os predadores, mesmo que sejam predadores diferentes. – então sua voz elevou-se – Então não me venha com essa de “prefiro morrer”! Pois eu sei que não é verdade. Resolva seus problemas da maneira correta e nunca repita isso de novo.
- Chefe… – disse Majin, uma lágrima percorrendo sua face – Por favor, chefe, não busca confusão. Illa tá certa. Eu tenho medo de morrer. E também não quero que o senhor morra, chefe.
Kilaf parecia impassível, mas distante. Olhos fechados, pensava no que a vestal cuspira sobre ele de maneira tão teatral. Ela tinha razão, claro. Mas a verdade não aplacou a raiva.
- Sim, ela está – disse, tentando se levantar, Majin acabou tendo de lhe oferecer apoio pois as costas pareciam travadas e cada mínimo movimento era como ser acertado em cheio por um raio – Somos todos animais, essencialmente. Mas acredito que nos diferenciamos deles em um ponto muito importante. Podemos deixar de ser presas e nos tornarmos predadores.
Quando um escravo tem as características de um gladiador, ele é toscamente treinado nos conceitos básicos da peleja, para então ser vendido no mercado. Mas não é incomum que aqueles que mostram mais aptidão ao combate sejam colocados como campeão do lote. Cada escravista tem seu próprio lote de escravos a serem vendidos e seu campeão é colocado em uma primeira batalha com sua contraparte de outro escravocrata. O vencedor, além de ter seu preço aumentado, também dá glória ao seu captor e valoriza o lote em geral. No entanto, as batalhas entre tais gladiadores são bem menos sustentadas por um treinamento e acessórios adequados, tornando a peleja sangrenta para os gladiadores e mais divertida para a audiência.
Trahark observava a primeira luta do dia com Kilaf acorrentado ao seu lado. Lutavam dois garotos, nus além das adagas enferrujadas empunhadas, que mal tinham saído da adolescência. Ambos representavam péssimos lotes, mulheres e crianças em geral, provavelmente provenientes de vilas de agricultores velhos e corajosos – ou estúpidos – demais para renderem-se à horda que os atacara. Inicialmente, os rapazotes eram relutantes em seus golpes, mas os chicotes de seus captores proveram o desespero necessário para que a batalha se tornasse um circo de sangue, tripas e gritos quase infantis. O escravo acorrentado rangia os dentes o tempo todo, remexendo-se em suas correntes. Era claro que ele não gostava do que via.
Um grito cacofônico e tinha finalmente acabado. Abalado, o vencedor foi tirado das areias arrastado para receber comida e tratamento, incapaz de mover-se. Com certeza era seu primeiro assassinato. Antes do golpe final, Kilaf virou o rosto, recusando-se a ver. Aquilo era ruim. Trahark sabia que este ex-soldado seria difícil de endurecer e mesmo com o terrível treinamento e uma enchente de ofensas o escravo ainda possuía brilho nos olhos. Esperança é o pior sentimento para um gladiador que pretende viver e compaixão era algo que poderia mata-lo, seja pela arma de um igual ou pelo chicote de seu senhor. Mas nenhum treinamento puxado, chibatadas e ofensas quebravam o espírito de um homem; disso o meio orc bem sabia.
Algumas mortes depois, chegara a vez de Kilaf. Um orc chamado Ulthur era o responsável pela apresentação dos concorrentes e seus senhores. Era um ser desprezível e mesquinho com suas presas vermelhas de mascar fumo escarlate. Vestia um costurado de peles de coelho, lobo e cervo criando uma aparência muito mais assustadora do que realmente poderia ser e possuía um chicote salpicado de pó de vidro para “amansar as feras”, como dizia. Sem um fio de cabelo na cabeça esverdeada e com as pontas das orelhas cortadas, era pouco mais do que um escravo da horda orc do leste, os principais fornecedores escravistas do sul do continente.
- Vem! Vem! – gritava Ulthur – Agora é a hora do que os sinhô estavam esperano! Os melhores lotes do dia! Do Oeste: Mão d´Ouro e os soldados de um forte da égua branca!
Em um palanque, o bárbaro em peles de lobo levantou-se e acenou em concordância com os gritos da multidão. Mão d´Ouro era um homem conhecido ao que parecia.
- Seu campeão!
Trahark retirou as algemas que lhe prendiam mãos e pés e empurrou o escravo para as areias. Ulthur continuou:
- Sim, um belo lote! Mas será tão bom quanto o de Machado Quebrado!?
Do outro lado do palanque, um orc gigantesco coberto em armadura de ferro coberto com tinta vermelha. Levantando um machado de tamanho correspondente ao seu, o escravista arrancou gritos e ovações em igual intensidade. Os orcs tinham uma cultura muito disseminada nestas partes do mundo. Eram nômades que saqueavam e escravizavam vilas humanas e de seu próprio povo. No entanto possuíam um local sagrado de culto ao sangue e ao grotesco, um vale praticamente estéril chamado por eles de Karen-Dhar.
- Jhuruk malek Abion! Um lote proveniente das forças do norte! Um raro lote, vejam como ele é forte!
O homem que entrou na arena era muito alto, passando dos dois metros. Apesar de extremamente magro e pálido, sua composição muscular era visivelmente superior a da maioria dos homens. Sua face, assim como a de Kilaf, estampava um completo desinteresse em seu forçado inimigo, mas sempre demonstrando raiva contra seus captores eventualmente até mostrando a branca dentição em ameaça. Espadas de bronze oleosas foram dadas aos dois guerreiros, enquanto eram conduzidos ao meio do círculo de areia e pedra.
De relance, Kilaf percebeu que Majin estava ao lado de Mão d´Ouro confidenciando algo diretamente em seus ouvidos. O bárbaro simplesmente sorriu e negou qualquer que fosse o pedido. Ulthur lhe deu um tapa na cabeça para chamar-lhe a atenção. Disse só para ele:
- Alguém tá te olhando rapaz – pegou a mão do escravo, fingindo verificar se não havia nada escondido, mas na verdade escondendo um pequeno frasco ele mesmo – Me pagaram pra botar isso na sua mão, posso sentir o cheiro de veneno de longe, e esse é bem forte.
Então o apresentador foi para o outro guerreiro para verificar suas mãos e também disse algo que Kilaf não pôde ouvir. Novamente em meio aos dois escravos, olhou para seus senhores e deu o sinal para começar o combate.
Nenhum dos gladiadores deu sinais de ataque. Os inimigos se encararam e não encontraram motivos para lutar. E então veio a primeira chibatada. Kilaf sentiu uma linha ardente formando-se em meio segundo nas costas. As farpas no chicote de Ulthur abriram caminho na carne trazendo parte delas juntamente com sangue ao sair. O golpe fez com que o guerreiro dobrasse os joelhos e cambaleasse à frente. O capataz urrava xingamentos tentando fazer com que os dois homens combatessem. Por duas vezes mais ele chicoteou o gladiador e por vezes iguais puniu seu adversário.
Mas um momento depois, todos se calaram. O gigante nórdico prendeu o chicote com uma única mão, as farpas da arma lhe cortando a carne e benzendo as areias de escarlate. Recusando-se a largar a empunhadura, o capataz chacoalhava o pulso desesperadamente. Dois passos e o pálido home estava ao seu lado, um clarão avermelhado alvejou todos os atônitos espectadores; chicote e braço foram ao chão e Ulthur caiu para traz ganindo como o cão que era e tentando inutilmente estancar o sangramento. Agora totalmente atento, o escravo rebelde rodopiava esperando ser alvejado por alguma flecha ou atacado por algum guarda. Antes que isso pudesse acontecer, um grito altivo chamou a atenção da multidão para o palanque.
- Chega! – era Mão d´Ouro, Majin ao seu lado – Parece que temos realmente um ótimo lote aqui! Este escravo é feroz, ó grande Machado Quebrado! Mas eu não acho que meu campeão fica muito atrás! Porém, eles não parecem querer lutar. Então eu tive uma ideia para deixar as coisas mais empolgantes tanto para os gladiadores quanto para nós.
- Estou ouvindo – a voz de Machado Quebrado era profunda, grave e mais forte do que pareceria possível, mesmo para uma criatura do seu tamanho.
- Quinhentas moedas para o senhor vencedor! – a multidão aclamou – E a liberdade para o gladiador que sobreviver!
Machado Quebrado soltou um som gutural que num mundo bizarro poderia ser compreendido com uma risada. Parou imediatamente quando percebeu que o rival estava falando sério.
- Mil moedas! Por menos que isso eu preferiria vendê-lo no mercado.
Satisfeito, Mão d´Ouro aceitou a nova oferta. Majin parecia mais desesperado que antes, apertava os cabelos com o punho fechado, sem deixar de olhar por um segundo sequer seu antigo companheiro de cela. Kilaf estranhou que o orc não tenha negociado o termo “liberdade”. Um temor subiu rodopiando por sua espinha. Mas o homem nórdico já vinha em sua direção em investida. Em suas grandes mãos pálidas, a espada de bronze parecia muito menor do que realmente era; e o peso da arma não parecia incomodar nem um pouco seu usuário.
Mas claramente a lâmina não era sua arma preferida, pelo menos não uma daquele tamanho. Ele deveria estar acostumado com algo muito maior, tão grande que perícia deixava de ser algo com que se preocupar. Porém, como era rápido! Para um homem daquele tamanho, tal velocidade era extremamente incomum. Um segundo golpe passou por cima de sua cabeça, perto o suficiente para levantar gemidos de excitação da plateia e uma risada de Machado Quebrado. Num esforço tremendo para ganhar espaço, o frasco entregue por Ulthur escapou de suas mãos.
- Pare! – implorou Kilaf – Você não entende? Eles não vão nos libertar! É só um truque para que lutemos! Pare com essa insanidade!
- Pequeno homem tem medo de morrer, é compreensível. Não é nada pessoal, então deixe de fugir e lute!
- Matarmo-nos não conquistará a liberdade de ninguém. Eles têm milhares de homens e nós estamos sós. Porque eles nos dariam a liberd… Hunf!
O gigante já estava em cima dele. Um pequeno salto para o lado o salvou de um golpe vertical. Mas não foi rápido o suficiente para livrar-se do segundo ataque. Saltou, mas ainda assim a ponta de bronze abriu uma linha em seu peito, libertando o sangue de sua prisão de carne. Com um arquejo, Kilaf levou a mão esquerda ao ferimento e cambaleou para trás.
- O orc prometeu! Agora morra com honra e coma com seus pais na grande mesa.
Longe de portar a grande força de seu inimigo e ferido, Kilaf aparou o próximo golpe. Precisou do apoio de ambos os braços para sustentar a força do homem nórdico, o sangue vazava muito mais rápido do que gostaria, mas Trahark tinha razão: a dor teria de esperar. Uma raiva cega tomou conta dele, enevoando sua mente e dando ímpeto a seus movimentos.
Aquela farsa já estava indo longe demais. Não bastava estar preso por correntes que nunca se quebrariam, agora também era controlado por senhores que nunca escolheu. Podia imaginar o sorriso na face de Mão d´Ouro, o fútil desespero de Majin, a indiferença do orc chamado Machado Quebrado. E como uma indesejada explosão lá estava ela, a mulher de amarelo. Ela nunca fora sua para começo de conversa, a intenção era usar seus dotes femininos ao seu favor, mas estes também o enganaram.
Rápido como um raio, Kilaf desviou-se para a esquerda, fazendo o gigante dar um passo a frente. Golpeou a parte interna de sua coxa, rodopiou e acertou também o lado do torso. Este segundo ferimento com certeza havia atingido os rins. O homem nórdico perdeu o controle sobre o joelho esquerdo e tombou tentando se afastar. Como um lobo flanqueando sua presa, o gladiador saltitou em um semicírculo para a direita. Ainda com expectativas de vitória, seu adversário tentou um corte vertical de baixo para cima, apenas para encontrar uma espada ensanguentada em seu caminho. Um movimento de pulso e o gigante estava desarmado. Mais um golpe e estava acabado.
- Vá encontrar com seja lá quem quiser, tolo. – sussurrou.
Não mais poderia dizer onde estava, às vezes era até difícil distinguir se estava neste mundo ou em outro. Mas sempre quando paravam a noite, o escravo voltava a sentir as dores excruciantes nas pernas e pés. A horda não dava descanso aos capturados que já tinham caído para menos da metade do número inicial. As bolhas castigavam os pés enquanto as pernas sofriam da falta de nutrientes adequados e da exigência terrível da marcha. Sob o luar recebiam um minúsculo pedaço de pão e meio copo de água lamacenta; os cavalos eram mais bem tratados.
Caolho contava o número de mortos e declarava aos sobreviventes com um sorriso malévolo. Só se entristecia por ele mesmo não poder dar cabo dos escravos.
- Menos dois – o homem desfigurado disse certa vez – Restam dezessete sacos de bosta. Ah, mas vocês parecem muito bem! Talvez não precisem de pão hoje…
E sempre alguns tolos imploravam pela comida. Caolho nunca concretizou a ameaça, porém. Na verdade, cada morto contava como cinco moedas a menos no mercado de escravos e Mão d´Ouro odiava prejuízos, aparentemente. Pareciam que andavam há eras, entretanto o capitão sabia em seus momentos de lucidez que apenas dez luas passaram sobre suas cabeças. Durante o dia, a dor desaparecia à medida que a corda que atava suas mãos ao próximo da fila era puxada ao som de açoites e xingamentos. Ele aprendeu a apreciar a sensação de nulidade, era uma bênção naquela terrível situação.
No décimo primeiro dia da caminhada forçada, chegaram ao seu destino. Não era uma cidade soerguida, mas sim um agrupamento de incontáveis tendas pequenas que rodeavam um grande círculo de vegetação amassada pelos tantos passantes. Naquele tempo, os mercados de escravos moviam-se pelo continente levando sua reprovável mercadoria para todos os cantos de Hyralfen. Os mercadores montavam estas praças com uma incrível dedicação, e exploração dos escravos menos valiosos. Era comum que se separasse o círculo interno ao acampamento em partes designadas para a venda de escravos por tipo: em geral gladiadores, trabalhadores, servos e de prazeres carnais.
Compunham os gladiadores os homens de composição física forte, apesar de algumas mulheres serem aceitas em determinados casos. Eles eram a “elite” dos escravos, recebiam os maiores benefícios, mas eram constantemente obrigados a lutar entre si, seja em arenas ou como soldados de batalhas escusas. Eram os únicos que poderiam alcançar a glória, mas apenas pelo combate. Em alguns casos, senhores muito satisfeito com seu gladiador poderoso e obediente, poderiam ser libertos e contratados como mercenários vitalícios – uma falsa liberdade, claro, mas possibilitando a posse de dinheiro e bens próprios.
Servos era qualquer homem ou mulher que possuía algum tipo de conhecimento de acordo com os interesses de seus senhores. Suas habilidades iam desde conhecer as letras até contar moedas. Tais escravos viam logo depois dos gladiadores em “mordomias” o que basicamente se limitava a comer melhor. Escravos do sexo eram a terceira classe mais importante, incluindo geralmente mulheres, crianças e jovens que se destacassem pela aparência ou conhecimentos nas artes carnais. E finalmente vinham os trabalhadores que eram basicamente qualquer um que não se encaixasse nas classes anteriormente descritas, sofrendo dias e noites em labor.
As arenas eram responsáveis por grande parte da diversão e fonte de renda dos nobres da época. Mercadores de escravos gastavam moedas sobre moedas em campeões e treinamento para estes, em vias de serem recompensados pela venda do escravo já lapidado ou em apostas no jogo sangrento. Quando um campeão atingia um reconhecimento considerável e já estava muito velho para lutar, ele se tornava um feitor responsável pelo treino dos novos “recrutas”.
Trahark era um meio orc que fez sucesso na arena. Ninguém conhecia suas verdadeiras origens e sempre que questionado, ele contava uma história diferente. Sua lenda diz que ele conquistou sua liberdade e logo em seguida matou seu antigo senhor, passando a trabalhar como treinador de gladiadores para aqueles que poderiam pagar um preço justo. A maior fonte de escravos eram claramente os bárbaros. Hordas invadiam cidades espoliando o ouro e algemando os moradores mais hábeis ou dóceis. Tais escravos eram levados para grandes mercados ambulantes e vendidos em leilões ou após uma luta promocional na arena. E foi para tal criatura que Mão d´Ouro enviou um escravo que um dia fora capitão.
- Qual é o seu nome, escravo? – perguntou o meio-orc. Sem resposta, o feitor não insistiu.
Nem um momento de descanso foi dado ao escravo calado. Vestido no mesmo algodão há dias, o homem era apenas um reflexo distorcido do que um dia fora. Seus olhos estavam pregados ao chão.
- Se não tem um nome, vou te dar um – completou o feitor – Kilaf! Esse é um bom nome, quer dizer bosta na língua dos orcs. É isso que eu vejo na minha frente, um grande monte de merda.
Finalmente os olhos do escravo enfrentaram seu capataz. Trahark gostou da reação. Ele carregava duas espadas de bronze nas mãos, armas comuns de gladiadores. O peito nu, longe do porte parrudo dos orcs, exibia incontáveis cicatrizes em mais variadas formas e tamanhos. Esguio como uma cobra, ele rodou em volta de seu aluno forçado batendo as lâminas uma na outra.
- Qual é sua arma de escolha, Kilaf? Deixe-me adivinhar: espada e escudo. Ah, claro, você bem parece ter sido um soldados antes de virar esse monte de bosta. Vamos ver o que você sabe fazer.
Kilaf pega a espada oferecida pelo meio orc. Sem muita reação, levanta-se e entra em posição de batalha. Trahark ri desdenhosamente. Um golpe horizontal impede parcialmente uma gargalhada, jogando o feitor para trás, ainda com um sorriso no rosto. Novamente em posição, o escravo avança bravamente em sucessivos golpes no vácuo, procurando abrir espaço. O braço servindo de escudo mas carente do item de proteção instintivamente é levantado, voltando a estaca zero. O feitor apenas observa, esperando por um ataque. Dois passos para frente e uma estocada. O meio orc gira para a direita e acerta seu aluno no nariz com o pomo da arma. Sangue começa a atrapalhar a respiração e os olhos são enevoados por lágrimas de dor. Kilaf sente uma pancada na parte de trás da coxa, tirando seu equilíbrio e levando-o ao chão em um baque dolorido. Trahark já está em cima dele com a lâmina fria e pegajosa de sangue ameaçando seu pescoço. O escravo solta a arma.
- Sua tática é muito previsível – diz o orc – Pode ter sido de alguma valia num campo de batalha, mas na arena de nada adiantará. Os malditos nobres nem sempre te darão um escudo para defender-se. Aprenda a ser rápido ou célere será sua morte. Agora levante-se.
Sangue vertia do ferimento na perna. E o antigo capitão não fez menção de mover-se.
- Dói, não é? Aprenda a conviver com a dor a lutar com ela e, principalmente, a guardar suas forças quando ferido. É quando você está ferido que o inimigo tem mais chances de mostrar uma abertura. – Ele virou-se e deu dois passos – Agora levante-se logo e tente ma…
A espada de bronze é arremessada em rotação. Acerta as costas do feitor com a lâmina, abrindo caminho na pele e vertendo um fio de sangue rubro e oleoso. Trahark vira e sorri.
- Então o monte de bosta tem ouvidos. Que bom, achei que estava falando para o vento. Uma manobra audaz, sem dúvida, mas com a arma errada. Sem contar que agora você está desarmado. – Um rápido movimento giratório e passos rápidos o coloca sobre o escravo em um piscar de olhos – Da próxima vez tente com uma adaga, de preferência uma confeccionada para isso.
Um chute na têmpora acaba com o primeiro treino.
Já fazia uma hora desde o chamado da trombeta. A gritaria no andar acima era ensurdecedora. Os prisioneiros da cela comum ao lado gritavam ensandecidos pela possibilidade de liberdade e também porque temiam por suas vidas. Presos ali, todos eles eram presas fáceis para a fúria bárbara que os levaria para morte, seja imediatamente ou depois de anos de escravidão.
Pés apressados desceram a escada de terra batida. Um rosto conhecido do capitão apareceu na pequena janela que ficava ao centro da porta grossa de madeira, seu antigo intendente estava desesperado e disse sofregamente:
- Cap-Capitão… Os bárbaros… Muitos… Nós… Desorganizados… Portão caiu. – ele tomou fôlego e decifrou a própria frase – São muitos bárbaros. Estamos desorganizados sem o senhor. O portão principal caiu.
O vigoroso prisioneiro já estava em pé em frente à porta.
- Destranque, soldado! – a voz de autoridade lhe havia retornado.
Sorrindo o intendente vasculhou os bolsos. O sorriso abriu-se quando ele tirou do alforje uma grande chave de ferro. Mas o item caiu no chão com um baque surdo, seguido logo em seguida pelo corpo de seu portador, cujo peito havia sido perfurado por uma machadinha, destroçando metal e carne como se fossem a mesma coisa. Fez-se silêncio na cela ao lado, mas por pouco tempo. A corja vitoriosa adentrou o calabouço caçoando os prisioneiros. Uma voz grossa aterrorizante calou as outras:
- Salko! Primo! Eu disse para você não deixar a horda! Está vendo o trabalho que me deu?
- Mão d´Ouro! – A voz do brutamontes ressonava respeito, algo impressionante e um tanto ridículo para um gigante tolo – Salko achou que primo tinha esquecido Salko.
- Um homem deve alimentar seus cães, mesmo que um deles tenha mordido a mão que dá sua comida. Andem! Encontrem a chave e liberte Salko. Tragam aquele e aquele pra venda e façam o que quiser com o resto.
O bárbaro que chegou a frente da cela do capitão era quase tão grande quanto Salko, tinha uma imensa cicatriz que lhe percorria a face direita e sobre uma órbita que continha pus e sangue seco no lugar de olho. Ele pegou o molho de chaves no chão e arrancou forçosamente a machadinha do peito do soldado morto. Cuspiu no cadáver despreocupadamente e virou o olhar para a porta e, consequentemente, para o rosto do capitão que estava estupefato. Era a primeira vez que ficava de frente com bárbaros desarmado. Perguntou-se se era assim que as vítimas viam seus ofensores: indefeso, o caolho mais lhe parecia um monstro deformado.
- Mão d´Ouro! Tem mais um aqui. Não gosto de como ele me olha, posso estripa-lo?
Mão d´Ouro era um homem mais comum do que o capitão poderia ter imaginado. Seus músculos eram definidos mas longe de serem estufados quanto os de Salko. Seu olhar era frio, mas possuía um brilho muito distante da indiferença predatória dos bárbaros comuns. Longe de ser altivo quanto Turshec, aquele homem carregava uma mistura da selvageria e sagacidade no olhar que logo se percebia que era mais perigoso do que se poderia julgar apenas pela aparência puída. Suas costas eram cobertas por uma capa de pele lupina que encobria um conjunto de placas de armadura que não combinavam. Carregava nas mãos enluvadas uma gigantesca espada embainhada em couro de carneiro. Um jovem garoto corria atrás dele carregando dificultosamente um arco de teixo e uma aljava de penas amarelas, cor que até o fim de seus dias lhe pareceria sempre manchada de vermelho. Ele fitou longamente o homem diante de si. Quando falou, sua voz calou novamente o ambiente.
- Você não é nenhum ladrão comum. É um soldado não é?
Não obteve resposta, o que parecia lhe divertir.
- Um capitão, então? – diante do fraquejo de seu interlocutor, confirmou sua suspeita – Veja, eu também sou um capitão, aos olhos da sua gente. Mas eu costumo liderar uma investida e não me esconder em baixo da terra.
Diante das risadas, o capitão tornou-se vermelho. Mas a única coisa que lhe passava pela mente era a mulher do vestido amarelo. Era tudo culpa dela. Não tivessem se envolvido, nada daquilo estaria acontecendo. Mas era tão bela.
- Tragam esse para a venda também – continuou Mão d´Ouro e só então percebeu que havia um homem mirrado encarcerado na pequena cela – Vejo que tem companhia, o outro é dos senhores, rapazes.
Majin lançou-se a frente, empurrando para o lado o capitão e agarrando-se com todas as forças à pequena portinhola.
- Mão d´Ouro! Senhor! Majestade! – ele confundia-se cada vez mais, tanto que teve de parar para raciocinar melhor, tempo preenchido pelas risadas dos invasores – Tenho uma oferta de negócio.
O líder bárbaro esboçou um meio sorriso desdenhoso. Virou-se para a escada e deu um passo.
- Eu sei onde está o Dragão Alvorada.
Não era pouco conhecida a lenda da peça de um antigo demônio que dominava aquela região, antes da Queda dos Deuses. Os bardos cantarolavam sobre a derrota de cem reis pelas mãos da criatura horrenda, esta que lhes tomou as coroas dos corpos e enviou para um renomado forjador para que este lhe forjasse um tesouro magnífico em troca de liberdade e fama entre seus senhores diabólicos. O ferreiro demorara anos para construir uma estatueta de ouro e cobre cuja altura variava de lenda para lenda, podendo medir de trinta centímetros a três metros. Quando finalmente a estatueta estava pronta, o demônio lhe comera as vísceras para que nunca mais fizesse uma jóia tão perfeita. Alguns diziam que o sentimento vingativo da alma do ferreiro apoderara-se da peça tornando-a eternamente amaldiçoada. Mas todas as lendas concordavam em uma coisa: o Dragão Alvorada valia moedas o suficiente para comprar metade de um reino.
- E onde está? – Mão d´Ouro aparentava ter caído na lorota do ladrão de galinhas.
- Há! Uma proposta de negócio eu disse. Deixe o capitão e eu livres e digo onde está.
- Eu tenho uma contra proposta: diga onde está ou você vai passar a noite com o Caolho aqui – em resposta o homem deformado lambeu os beiços.
- Se eu ou meu amigo formos machucados você nunca saberá onde está!
- E como posso acreditar em você?
- Minhas coisas foram tiradas de mim quando me jogaram aqui, mas tenho provas. Traga minha bolsa, uma feita de couro vermelho com detalhes verdes, e mostrarei.
O jovenzinho não esperou nenhum comando e saiu correndo escada acima. Minutos depois ele voltou com a bolsa que Majin descrevera.
- O que eu devo procurar, linguarudo?
- Tem um compartimento secreto costurado no fundo da bolsa feito para parecer parte da costura, examine o conteúdo e aceite minha verdade.
Mão d´Ouro vasculhou a bolsa, lançando ao ar roupas e outros objetos pessoais do ladrão. Finalmente ele tirou uma pedra vermelha da bolsa.
- É só uma pedra – interferiu Salko – deixa o Salko matar ele devagar!
- Eu imploro, Mão d´Ouro, examine melhor.
Olhando contra a fraca luz de uma tocha, era possível notar-se que a pedra era translúcida. Rubi Escuro era como os joalheiros a chamavam, um rubi exposto a uma chama tão quente quanto o fogo de dragão tornava-se escuro e quase opaco, uma técnica de forja muito antiga e pouquíssimos ourives diziam conhece-la e menos ainda falavam a verdade.
- É um Rubi Escuro – disse Majin, ganhando confiança – Uma lasca do Dragão Alvorada. Tenho a informação de onde está a peça, mas você vai precisar de mim para resgatá-la. Dizem que ela está protegida por inúmeras armadilhas e até por magia!
Se o ladrão estava contando uma contando uma mentira, ele era muito bom nisso. Nem mesmo o capitão não se sentia seguro para acusar aquilo como um blefe. Estava estupefato com o conhecimento ou a lábia daquele marginal.
- Veja bem… – Mão d´Ouro mostrava-se sagaz – É uma ótima proposta admito. Mas como ficarei eu se estiver mentindo? Prefiro cortar sua cabeça e vender esse rubi do que ter a incerteza de que talvez um dia você me leve ao Dragão Alvorada. Mas me sinto piedoso hoje. Faremos assim: Você vem comigo como meu… convidado. Nenhum de meus homens vai tocar em você, mas você não vai sair de perto de mim. E seu capitão… sinto muito, mas este não faz parte do trato. Ele vai para a venda. Mas como um ato de boa vontade vou colocá-lo como campeão do lote.
- Desculpe – sussurrou o criminoso para seu companheiro de cela e virou-se novamente para o bárbaro – Trato feito!
Capítulo 1: A Queda
Ele não sabia como aquilo tinha começado. Suas mãos estavam cobertas de sangue enquanto batia a cabeça da mulher de vestido amarelo na parede de madeira. Algo tomara conta de sua mente. Mesmo culpando-se pelo crime, o capitão continuava os golpes brutais contra um crânio há muito destruído. O corpo feminino não se mexia desde a quinta batida no frio carvalho. Chovia lá fora e a noite reinava. O sentimento de vingança custou a ser exaurido mesmo depois de cumprido. Quando voltou a seus plenos sentidos, caminhou até a cadeira mais próxima como se tivesse acabado de acordar de um pesadelo interminável. Suas mãos ensangüentadas tremiam enquanto murmurava palavras inutilmente, tentando dar razão àquela insanidade.
- Fui traído – tentava argumentar com um juiz invisível – Não tive outra escolha – e inspirou profunda e sofregamente, finalmente lembrando-se que não respirara desde que tudo começara – Devo fugir – mas não se moveu.
A cadeira foi seu leito até que o sol despontou do leste. Não sentia cansaço e lhe faltou o sono. A maneira de livrar-se daquela situação nunca lhe veio à mente. Não queria livrar-se, percebeu finalmente, não queria ser despido da culpa. Menos de uma hora depois da aurora, o intendente bateu na porta. Depois de cansar-se de esperar resposta, o jovem forçou sua entrada embora a porta estivesse aberta. Pálido ao ver a cena amarela e rubra, fugiu rapidamente. E poucos minutos depois, cinco soldados vieram ter com seu capitão.
- O que é isso!? – perguntou o mais audaz – O senhor fez isto, capitão?
Mas sua frase foi mais uma afirmação perplexa do que uma pergunta. O mais velho dos soldados caminhou até a morta, confirmando o que era óbvio para qualquer observador. Após terminar o trabalho ingrato, olhou para o capitão, levantou-se lentamente proclamando a sentença.
-Capitão, o senhor está preso.
Quando percebeu que o homem exibiu um olhar vazio desprovido de resistência, o soldado veterano ordenou que seus irmãos em armas levassem seu antigo capitão a uma cela. Arrastado pela pequena vila, o assassino ignorava os olhares de ódio dos camponeses e dos homens que no dia anterior liderava. A cela era comunitária e situada no subterrâneo do forte improvisado que fora erguido meses antes. Os outros ladrões e assassinos receberam o capitão com olhares de desprezo e interesse. Assim que os guardas trancaram a porta, um brutamontes acusado de assassinato aproximou-se. Claramente ele era o macho alfa daqueles homens condenados.
-Afaste-se – disse simplesmente o capitão, mas sua voz não era autoritária como havia sido e de nada diminuiu o avanço do grande homem.
O brutamontes, chamado Salko, socou a face do homem de mãos ensangüentadas. Vendo que seu golpe não encontrou resistência ou mesmo raiva, Salko imaginou que o capitão estava temeroso devido a sua supremacia física. E foi a brecha que faltava. O brutamontes levantou o capitão pela camisa de algodão que usava, ergueu-o facilmente trinta centímetros do chão, forçando-o contra a parede.
- Seus homens me prenderam aqui, sabia disso? E agora os cãezinhos mandam seu dono para a boca de Salko, o Lobo Negro – o divertimento em sua voz era perceptível, ele estava procurando mais diversão do que vingança – Não vai chamar seus cãezinhos agora? Ah, eles te jogaram aqui do mesmo jeito que jogaram todos nós, não vão vir resgatá-lo. Você não chega ao meio-dia, cãozinho, mas primeiro vamos ter uma pequena conversa. Só você e o Salko aqui.
Mas não foram palavras que se seguiram e sim mais socos e chutes. Faltavam-lhe dois dentes quando o brutamontes parou para descansar um pouco. Aquilo não poderia continuar, ou morreria, pensou debilmente.
- Guardas! – chamou um outro preso, este acusado de roubar algumas galinhas da cozinha do forte.
Quando os guardas chegaram, Salko já havia sentado em seu catre, fingindo que não era com ele. Os carcereiros pareciam irritados, então o ladrão que os chamara argumentou que o novo cativo não sobreviveria se o deixassem ali. Mesmo assim, descontentes, eles espancaram o pobre homem e o levaram junto com o capitão para outra cela, muito menor. Mas seu tamanho era compensado pelo cheiro de excremento que parecia vir de todas as paredes de pedra.
- De nada – disse o ladrão, Majin, mas o capitão não respondeu.
Em vez disso, apenas aninhou-se num canto da cela e ficou imóvel. Horas depois, o homem franzino já tinha contado toda a sua vida e suas tragédias, mesmo tendo encontrado apenas o silêncio como resposta. Contou que seu pai era um fazendeiro, mas não tivera tempo de criá-lo pois fora morto pelos bárbaros junto com a mãe e mais dois irmãos. Sua irmã havia sido estuprada e levada para satisfazer os prazeres futuros dos rufiões. Majin havia sido esperto e escondera-se embaixo do chão de madeira da choupana. Mantivera-se vivo desde então roubando comida, roupas e outros itens para vender no mercado, se o mercador aceitasse trocar algumas poucas moedas por algo de procedência duvidosa. Já havia sido pego uma vez e lhe cortaram o indicador da mão esquerda. Desta vez provavelmente lhe tirariam dois dedos, por ser reincidente.
Um carcereiro abriu a porta grossa de carvalho e jogou duas tigelas com mingau para dentro, desinteressado se metade do conteúdo transbordaria com o impacto no chão de terra batida. Majin correu imediatamente para a comida e a devorou em menos de minuto. Olhou para o capitão, indagando se poderia comer sua parte também. Quando não obteve resposta, pegou a segunda tigela lentamente, examinando a reação de seu companheiro.
- O que você fez chefe?
- Eu matei uma mulher indefesa – disse finalmente o capitão. Majin estava assustado com a voz grave, mas exibiu um meio sorriso, sentindo-se vitorioso.
- Você e metade dos seus homens depois de estuprá-las. A questão é: porque o senhor está aqui, enquanto poderia dispensá-los com apenas uma ordem.
O capitão não tinha uma resposta para aquilo. Quando Turshec chegara a sua vila mal tinha saído da infância e fora facilmente impressionado pelas palavras heróicas e a promessa de livrar-se dos bárbaros. O Cavaleiro Branco era um líder nato, passava de vila em vila, cedendo alguns soldados para proteção enquanto recrutava muitos mais homens do que deixava. Uma vida de batalha revelara-se muito menos glamorosa do que imaginava, os guerreiros de Turshec não se diferenciavam muito dos bárbaros: estupravam, matavam e espoliavam tanto quanto eles, mas tinham o aval da população, que era enganada pela conversa de liberdade e segurança e acabavam dando suas filhas e suas colheitas de bom grado em troca de uma falsa segurança. A verdade é que Turshec apenas organizara o ódio dos habitantes das vilas abandonadas pelos deuses e dava a oportunidade de vingança e de tomar de volta os espólios dos bárbaros, mas sem a intenção de devolvê-los para seus donos. Foi um alívio quando finalmente se tornara capitão e fora designado para construir um forte e organizar uma linha de defesa naquelas terras que representavam a fronteira do território controlado pelo Cavaleiro Branco e as terras sem dono. Forte esse que agora se tornara sua prisão.
- O juiz vai chegar a três dias, então é melhor o senhor dar a ordem logo, porque ele não vai ter pena do senhor – o juiz a que Majin se referia era um clérigo do deus da justiça, Hurst, que viajava de vila em vila a cada uma ou duas semanas, para julgar os crimes e efetuar as punições.
- Não posso – Majin estava perplexo, com razão. Geralmente os capitães eram os piores soldados, aproveitando-se da vila que supostamente deveriam tomar conta. Enquanto prendesse sua cota de criminosos, sendo eles culpados ou não, a população praticamente os venerava – Minha honra foi perdida. Mereço pagar por meu crime.
O ladrão riu a ponto de tossir violentamente. Honra era uma característica desdenhada naqueles tempos difíceis e na maioria das vezes fingida para adquirir a confiança dos menos afortunados.
- Você vai morrer, chefe – Majin sentenciou. Mas o capitão não queria morrer.
Depois de anos lutando contra bárbaros, vendo o pior lado de todos os homens e tendo pesadelos com todas as sangrentas cenas que tinha presenciado. Num tempo sem honra ou bondade aparente, a paranóia tomava todos aqueles que chegavam a uma posição de liderança. E mesmo assim, a morte não parecia ser o caminho certo a ser seguido. O medo do que vinha após o final carnal ainda atormentava sua mente. Mas por uma coisa o capitão não esperava: o inimigo que enfrentara durante a maior parte de sua vida, o libertaria de seu final certo.
No início daquela noite, uma trombeta reverberou na superfície. Estavam sendo atacados.
Hey! Eu quero ajudar! Me diga como!